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quarta-feira, dezembro 21, 2005

Pra que mudar a internet?

Dagomir Marquezi é colunista da revista Info e em seu artigo do mês de Dezembro de 2005 pede que alguém forneça alguma razão não política para retirar o controle de nomes de domínio da internet das mãos da Icann.

A Icann é uma organização independente criada nos EUA para gerir os domínios na Internet. É a espinha dorsal da rede global que você está usando para ler esse texto nesse exato minuto. Marquezi defende, com razão, que não deve ser uma decisão política retirar o controle da Icann. Mas usa o famoso argumento do "em time que está ganhando não se mexe" para defender seu ponto. Se a internet funciona bem, deixem-na como está, é o ponto que Marquezi parece querer ressaltar. É onde sua visão falha.

Imagine se essa fosse a opinião da indústria automotiva do início do século! O carro já é bom, já é mais rápido e melhor que uma carroça a cavalo, então não precisamos mais melhorá-lo, pois já está bom o bastante. E estaríamos até hoje andando em veículos à vapor, queimando carvão atingindo incríveis 40KM/h de velocidade máxima. Ainda bem que Otto não pensava como Marquezi e achou que mesmo algo que funcionava bem ainda poderia ser melhorado!

Voltando ao artigo da Info, Marquezi insiste que alguém deva dar boas razões apolíticas para mudar o esquema de controle de domínios atual da Web, mesmo quando ele falha em dar boas razões apolíticas para que ele continue como está. Tudo bem, não vou discutir as razões políticas, vou fazer o que Marquezi pediu e manter as razões no campo não político e começar meu artigo de verdade:

4 Razões Não Políticas para que o controle da internet saia das mãos da Icann.

Razão 1: 15 membros não garante representatividade participativa
O conselho administrador da Icann possui 15 membros, dos quais 2 são brasileiros, de várias partes do mundo. Isso deveria servir para mostrar que a administração da Icann (e portanto da estrutura da internet) não é dos EUA, mas sim de todo o mundo. Agora pense sobre o conceito de democracia por um instante. Dizer que 15 membros que são indicados e não eleitos garantem representatividade em uma administração que envolve interesses de mais de 180 países é meio estranho, não?

Razão 2: A Icann é não governamental, mas age como se fosse
A Icann não está sujeita ao governo dos EUA, mas por força da lei deve satisfações ao Departamento de Comércio dos EUA. Então de maneira indireta o governo dos EUA pode exercer algum controle sobre a Icann, e isso já ocorreu várias vezes (citarei um caso mais à frente). Uma rede que pretende ser global e livre para todos não pode estar sujeita aos desígnios de nenhum governo, nem mesmo o dos EUA.

Razão 3: A Icann não toma decisões por mérito técnico, mas sim por mérito político
O comportamento da Icann diante dos problemas estruturais da rede, como a falta de segurança, a facilidade para fraudes e as limitações do modelo de IP com 4 conjuntos de 3 dígitos nunca é técnico. Sempre em lugar de resolver as deficiências e tomar atitudes para sanar problemas a Icann aguarda as decisões do governo dos EUA. Somente após regulamentações legais é que a Icann mobiliza algum esforço técnico. Assim quem tem ditado o tom e o ritmo das mudanças na internet tem sido sim o governo dos EUA. Essas mudanças deveriam ocorrer com embasamento técnico.

Razão 4: Uma internet 2, concorrente da atual seria prejudicial a todos
Essa solução, defendida por muitos inclusive por Marquezi, de que se não estão satisfeitos os outros países do mundo podem criar uma nova internet para rivalizar com a atual, controlada pela Icann, é uma faca de dois gumes. Enquanto todos brigamos pela implantação de padrões abertos que proporcionem a livre troca de informação falar em criar uma outra internet é contra-senso. Com todo o dinheiro e tempo gasto para fazer as duas internets comunicarem-se entre si poderíamos melhorar essa e resolver seus problemas. Não é para a internet ser livre? Então que seja, inclusive na administração, ora.

Agora vou fundamentar o que foi escrito acima com um pequeno estudo de caso.

"Qualquer governo que puder influir no funcionamento da rede vai querer exercer esse poder em algum grau" frase de Demi Getschko, engenheiro do Comitê Gestor de Internet no Brasil. É isso que o governo dos EUA está fazendo. Quando a Icann sugeriu a criação do domínio .xxx (triplo x) para sites com conteúdo pornográfico o congresso dos EUA foi contra e impediu a criação desses domínios por 5 anos. Esse é o nível de independência que a Icann tem do governo dos EUA.

Com domínios .xxx as empresas de pornografia poderíam registrar seus sites com exatidão. Os usuários não seriam confusos por fraudes envolvendo esses domínios. E mesmo os pais preocupados com o conteúdo que seus filhos acessam estaríam mais protegidos, já que seria apenas uma questão de bloquear todos os domínios terminados com .xxx em seus computadores. Todos esses prováveis benefícios foram negados à comunidade de usuários da internet porque o (conservador) congresso dos EUA não queria que existisse um domínio exclusivo para pornografia.

Por essas e outras me parece ser uma questão de progresso tecnológico e mérito técnico retirar o controle de DNS da Icann. Não tem nada a ver com política, e sim com liberdades civis e com a melhoria do melhor meio de comunicação disponível hoje. Um conselho verdadeiramente independente poderia tomar as decisões mais adequadas para melhorar (de verdade) cada vez mais a internet e sua estrutura. Os EUA poderiam continuar participando das decisões administrativas desse conselho, com seu voto valendo o mesmo que o dos outros países, como deve ser em qualquer democracia.

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Comments:
Concordo plenamente que o controle da Internet tem que sair da mão dos EUA (convenhamos que é quem detém o controle hoje).
Quanto ao TLD .xxx parei de me esforçar pra ser feito depois que li isso aqui.

http://ars.userfriendly.org/cartoons/?id=20050821&mode=classic

Sad but True.

Abraços
 
Para mim o fato político já é mais que suficiente.

Pimentel
 
Olá amigos!

andreyev: a estrutura de TLD que a Icann administra não é tão extensa assim, resume-se à 13 servidores de grande porte e alguns links de fibra-ótica e satélites. A grande parte da estrutura física da internet é da iniciativa privada, como a Nortell, a AT&T a Embratel, etc. Um órgão plurinacional que recebesse recursos de várias nações do mundo (inclusive da União Européia) poderia facilmente ser capaz de administrar. Além disso a presença de servidores de TLD em lugares onde eles não existem hoje (como na América do Sul) dariam mais agilidade e segurança ao sistema como um todo. O modelo do "ditador benevolente" ao qual você se refere não é bem o aplicado no Linux, já que eu posso pegar o código do kernel e mudar o que eu quiser para meu uso ou distribuição, e isso não acontece na internet. Não há ditador benevolente na Icann, há apenas o ditador. Por mais que achemos que IPv6 é necessário e que deva ser implantado isso só ocorrerá de fato quando o Icann achar que deva ocorrer, não importa o que o resto do mundo pense. Idem para domínios com letras em línguas distintas do inglês. Por exemplo, eu não posso criar um domínio www.segurança.com.br, apenas www.seguranca.com.br. Só que seguranCa não é uma palavra da língua portuguesa. Esse é o tipo de mal que a Icann e o governo dos EUA impõe à internet e que acabaria com a descentralização da administração da rede. Hoje o que a Icann não quer não é feito e o que o governo dos EUA não quer a Icann não quer por limitações jurídicas e é esse tipo de coisa que deveria acabar.

rafael: o impacto de ter que registrar diversos domínios para uma mesma empresa, como por exemplo petrobras.com, petrobras.com.br, petrobras.biz, petrobras.oil, etc é apenas uma amostra de como a Icann tem sido inapta em prever e antecipar problemas de copyright envolvendo a internet. Uma simples regulamentação poderia acabar com esse quadro, mas parece não ser de interessa da própria Icann que isso ocorra, já que para cada domínio ela mesmo fatura alguns dólares, e o governo dos EUA tb, já que recolhe impostos sobre essas transações. Da maneira que é hoje quanto mais registros uma empresa precisa fazer melhor é para a Icann e para o governo dos EUA. Uma regulamentação séria sobre nomes de domínio poderia impedir ou minimizar esses problemas, mas significaria que os controladores da rede ganhariam menos dinheiro, então nada feito. Quem cuidava dos registros .com.br era a Fapesp e hoje parece que é o Comitê Gestor de Internet no Brasil (CGIB) mas para registrar um domínio .com.br vc precisa ter uma empresa aberta e um CNPJ válido. Para registrar um .com junto a Icann você não precisa de empresa. A diferença é que no Brasil se minha empresa registrasse www.coca-cola.com.br a Coca-Cola iria acionar minha empresa judicialmente por uso indevido da marca. Nos EUA se eu registrasse www.coca-cola.com a Coca teria que comprar o domínio de mim pelo preço que eu quisesse, já que eu fui mais rápido que ela. Isso é uma tática para obrigar as empresas a registrarem seus domínios de maneira preventiva, o que é péssimo. Esse tipo de política colocou todo o resto do mundo contra a Icann, pois empresas de toda parte do mundo tiveram problemas com cidadãos dos EUA que haviam registrado seus nomes junto a Icann e a única maneira de reverter isso seria na justiça dos EUA. Então temos a justiça dos EUA legislando e decidindo sobre a administração da Internet, o que é fundamentalmente errado, pois a rede não deveria ser deles, mas é.

Há duas maneiras de resolver isso:
1- Criar uma nova internet: o que é péssima idéia por diversos motivos
2- Passar a administração da internet para um órgão independente e internacional: que é o melhor caminho a seguir.

Agora se os EUA não exercem controle sobre a rede por que estão tão loucos com essa história? Por que não querem largar o osso? Porque eles de fato exercem controle sobre a rede e seu funcionamento e passar a administração para um outro órgão seria perder a capacidade de exercer esse controle. Eles acham isso ruim e farão de tudo para impedir que o controle da rede saia das mãos da Icann.

Pimentel: Para mim o motivo político também é suficiente, mas ressaltar os motivos técnicos é bom pois torna mais difícil ainda para os opositores da idéia manterem sua opinião. Tão difícil que eles tem que apoiar-se em artimanhas para manter seu ponto, como ocultar que a União Européia defende a idéia ou dizer que os países que querem tirar o controle da Icann são apenas aqueles que querem cercear direitos civis, como a China, o Irã, Cuba e etc. Esquecem-se que os EUA são um dos países do mundo que mais comete desrespeitos civis no mundo. Até a década de 60 negros não podiam sentar nos mesmos assentos que brancos em muitos estados do sul dos EUA. Negros também não podiam cursar as mesmas universidades que brancos há 40 anos nos EUA. Hoje os EUA mantém presos em bases militares cidadãos de outros países sem que eles tenham direito à visitas de advogados, à visitas de famíliares e a um julgamento, sem sequer terem sido acusados formalmente de qualquer crime. Os EUA financiou dezenas de ditaduras militares de direita em países da América Latina, da África e da Ásia provocando a morte de centenas de milhares de pessoas inclusive no Brasil. É esse o bastião de liberdade que controla a internet hoje, o grande exemplo de democracia.

Então cuidado! Quando alguém disser que para o bem da liberdade da internet ela deve permanecer sob controle dos EUA há algo errado. Ou este é mal informado e desprovido de noção histórica ou é membro do mesmo grupo que implantou a ditadura militar por aqui, entreguistas que gostariam de ver o Brasil como um novo Porto-Rico, um novo México ou uma antiga Cuba.
 
Falcon, só pra complementar seu comentário, é possível sim registrar domínios.com.br com acentos e cedilhas, desde a metade deste ano, se não me engano.
 
Defendo a mudança pelo seguinte: Os EUA desde os tempos da guerra fria usaram trojans para espionar os coitadinhos dos agentes da KGB, que pegaram disquetes com programas espiões pensando que estavam roubando informações secretas, quando na verdade era uma isca. Já lí também sobre o carnivore, programa espião que é instalado em roteadores para ser usado como filtro a serviço das agências de espionagem americanas. Lí também recentemente (não me recordo agora o link) que os EUA estão contratando super hackers. Seria pura inocência do resto do mundo achar que o país, que sozinho investe a metade do orçamento global com armas, deixaria a internet de fora de seus planos de dominação global. Portanto defendo a mudança por questões estratégicas. Imaginem que a "História" do Matrix, com muitas diferenças já está acontecendo, e não podemos subestimar o uso da teconologia como instrumento de dominação ideológica, militar, tecnológica etc.
 
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